Exclusivo: consumidores relatam negociações conturbadas e falta de comunicação com instituições de ensino no Rio
Foto: divulção / IBMR

Nesta terça-feira (07), foram confirmados 13.717 casos e 667 falecimentos devido à Covid-19 no Brasil. Vale lembrar que, segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, o Rio de Janeiro é um dos estados que podem avançar para uma fase de aceleração descontrolada dos casos de coronavírus.

Por conta de um decreto publicado no Diário Oficial pelo governador Wilson Witzel (PSC), o estado fluminense está em isolamento social desde o dia 17 março. No dia 30 de março, Witzel prorrogou o prazo da quarentena por mais 15 dias. O isolamento social foi uma medida adotada pelo governo para reduzir movimentação e aglomeração da população, sendo assim, é possível evitar que uma quantidade menor de pessoas sejam contaminadas pelo novo vírus.

Como não pode haver aglomerações, as aulas presenciais foram suspensas tanto na rede pública quanto no setor privado. Porém, para não prejudicar o ano letivo, muitas instituições recorreram à tecnologia e começaram a ministrar aulas à distância. Diversos estudantes e responsáveis aprovaram as atitudes das empresas para não prejudicar a área pedagógica, mas alegam problemas e falhas de comunicação no âmbito administrativo.

  • Ensino superior

Estudantes de diversas universidades do Rio de Janeiro, que antes da pandemia participavam de aulas presenciais, agora estão em casa participando da Educação à Distância (EAD). Entretanto, os consumidores reclamam que não houve nenhum reajuste nas mensalidades tendo em vista que as empresas estão economizando com outras despesas e oferecendo outro serviço, segundo os estudantes, com qualidade inferior. Vale lembrar que as instituições, normalmente, já ofereciam o serviço de aulas online com preço mais acessíveis do que aulas presenciais.

Bruno Santiago, de 23 anos de idade, é autônomo e estudante de Análise de Sistemas no Centro Universitário IBMR. Em entrevista exclusiva à VAVEL Brasil, ele nos contou que entrou em contato com a universidade para negociar a mensalidade, assim como outros alunos, e nos relatou a resposta da empresa. 

"A Letícia, do IBMR, acabou de me ligar. Conversei e expliquei toda a nossa situação. Não tem jeito. Nós temos apenas duas opções:

Quer trancar?  Paga 100 reais para solicitar o trancamento mais 50% do valor da mensalidade de abril, maio e junho. No meu caso, pago 804 reais e para trancar ficaria 1.306 reais. Sem condições. 

O IBMR está dando outra opção mais válida. Reduzir créditos das aulas. Cada aula presencial são três créditos. Eu tenho seis aulas esse semestre, ela (Letícia) fez as contas, tirando três aulas de 804 reais cai para 361 reais e,  se quiser tirar quatro aulas, fica 200 e poucos reais. 

O IBMR não quer cancelar as aulas porque será injusto com os alunos que já vão se formar neste semestre.Não consegue agradar a todos. As aulas online vão continuar até a quarentena acabar. Não tem escolha. 

Outro lado negativo é que reduzindo matéria esse semestre vai nos atrasar futuramente. Tecnicamente, só pode pegar 20 créditos por semestre e fica ruim encaixar mais matérias por causa da grade péssima de dias e horários. 

Fico chateado porque reduzindo certa quantidade de matérias agora, os meses que já paguei (janeiro, fevereiro e março) serão jogados no lixo."

Além disso, fontes confirmaram à nossa equipe que há um abaixo-assinado circulando entre os estudantes pedindo a redução do valor das mensalidades até o fim da pandemia e será entregue ao Centro Universitário IBMR.

  • Ensino médio

O relatos não são apenas dos alunos universitários. Responsáveis e estudantes do ensino médio também reivindicam descontos nas mensalidades e uma melhora na comunicação. Leila Serra, jornaleira e responsável financeira de uma estudante do Ícone Colégio e Curso, nos contou como está a situação na instituição e opinou sobre o assunto. 

“O Ícone sempre teve aulas presenciais, mas também sempre teve vídeo-aula. Além dos trabalhos que eles (professores) passam no colégio, passam trabalhos que eles (alunos) precisam fazer pela internet. Isso sempre teve. Sempre teve esses dois tipos de estudo antes do COVID-19.

Isso foi mantido agora. Só que, além deles fazerem isso que já tinha, eles estão intensificando mais ainda a quantidade de trabalhos e vídeo-aulas. Já começaram a mandar trabalhos para entregar até o final do ano. Eles intensificaram muito. Foram muito rápidos quanto a não deixar parado e não atrasar matéria. Agora, quanto a mensalidade, até o momento não veio nada na agenda digital, e-mail ou outros meios. 

Acho que deveria ter um desconto tendo em vista que, não só eu, muitas pessoas trabalham na informalidade ou são microempresários. Tanto eu quanto o pai dela (aluna) somos jornaleiros, eu sou registrada como MEI e ele não, estão falando que o governo vai dar alguma ajuda para quem está fora do mercado de trabalho e, talvez, eu consiga essa ajuda e o meu marido não vai ter ajuda nenhuma. Mesmo assim, estão sendo obrigados a fechar. Estando com o negócio fechado, a gente não recebe e não tem renda nenhuma. Muitos são empresários que tem condições, mas muitos também são e não tem condições. Tudo bem que o Ícone está se empenhando ao máximo, mas acho justo o desconto na mensalidade e até agora não tocaram no assunto desta parte financeira.”      

  • Ensino fundamental 

A mesma ocorrência do ensino superior e do ensino médio também está acontecendo no ensino fundamental. A grande maioria das escolas optaram por adiantar 15 dias das férias do meio de ano, em seguida, improvisaram ou planejaram o método de aulas à distância. 

Renata Benevides é professora e responsável financeira de uma aluna do Centro Educacional Silva Xavier. Ela nos relatou a falta de comunicação do colégio quanto às questões financeiras e opinou sobre o assunto.

“Eles (colégio) colocaram as aulas online no lugar das aulas presenciais e ninguém falou nada sobre mensalidade. Continua a mesma coisa. Tudo igual. Hoje, eu vi algumas notícias nos jornais sobre o Bolsonaro falando sobre diminuir os 200 dias letivos e, sobre essa questão das mensalidades, tinha um representante do PROCON-RJ dizendo que as escolas não têm obrigatoriedade em dar desconto, mas você poderia entrar em contato com a escola e negociar para ver se a escola daria o desconto ou não. 

Eu acabo achando justo porque estou do lado dos professores também, entende? Está muito mais difícil o professor dar aula online do que presencial. Acabou que do nada os profissionais tiveram que dominar a área de tecnologia, que muitos não estão familiarizados, para poder dar aula. O professor acaba tendo o dobro de trabalho e, por exemplo, não acho justo reduzirem o salário dele. Reduzindo a mensalidade, vai reduzir o salário do professor.

Eu acabo ficando dos dois lados. Como consumidora, lógico que gostaria do desconto. Ela (instituição) não está usando o espaço físico e não está usando a luz da escola, né? Mas, ao mesmo tempo, você tem os encargos.”  

  • O que diz o PROCON-RJ?

Procurado pela equipe de reportagem da VAVEL Brasil, em nota, o PROCON-RJ afirmou que não é obrigatório que as instituições de ensino apliquem os descontos nas mensalidades, disse que ambas as partes podem buscar algum acordo e dissertou sobre outras despesas operacionais que a troca de aulas presenciais por EAD ocasionaram.  

Confira a nota do PROCON-RJ na íntegra:

“Ainda que as atividades estejam sendo prestadas à distância, as mensalidades devem ser pagas normalmente, sendo certo que o contrato de ensino tem carga horária mínima definida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, e essa carga está sendo cumprida à distância por necessidade de preservação da saúde pública.

O primeiro passo é entrar em contato com a instituição de ensino e descobrir como ela pretende cumprir a carga horária mínima definida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação. O contrato de prestação de serviços educacionais pode ser semestral ou anual (observada a carga horária mínima), e o pagamento das prestações parcelado. Portanto, enquanto possível a prestação do serviço após o período da pandemia, o consumidor deve continuar pagando regularmente as mensalidades.

Não é obrigatório que a instituição reduza o valor da mensalidade. Porém, nada impede, no entanto, que o consumidor procure a instituição e solicite um desconto, por conta da provável redução dos custos do fornecedor.

O contrato de prestação de serviços educacionais deve obedecer a carga horária determinada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Portanto, a escola deve repor aulas eventualmente não ministradas, razão pela qual não é cabível se falar de desconto na mensalidade. Os descontos podem ser oferecidos sim, em caso de prestação de serviços acessórios aos educacionais, se esses não forem prestados. 

Não há obrigatoriedade na redução da mensalidade, pois esta deve levar em conta não só os custos fixos, que independem de a escola estar fechada, mas também os novos custos, especificamente relacionados à logística do ensino à distância, principalmente se a instituição teve de implementar a tecnologia em virtude da epidemia. É possível, ainda, que a escola precise de um tempo para contabilizar seus custos regulares de funcionamento. É preciso, portanto, transparência, paciência e diálogo, para que consumidor e fornecedor consigam chegar a um termo que seja o mais justo possível para todas as partes, possibilitando a continuidade da prestação da educação. 

Não há quebra de contrato, mas força maior aplicada a ambos os contratantes, por isso a substituição das aulas presenciais pelas aulas virtuais não implica na autorização de cancelamento do contrato.”

  • Projeto de lei (PL)

Foram protocolados dois projetos de leis, com o mesmo objetivo, em câmaras diferentes. No Rio de Janeiro, em âmbito estadual, o deputado André Ceciliano (PT) protocolou o projeto de lei 2052/20 na ALERJ. O documento contou com a colaboração dos deputados Dr. Serginho (PSL) e Rodrigo Bacellar (SDD). Já em Brasília, a deputada federal Clarissa Garotinho (PROS-RJ) protocolou o projeto de lei 1119/20 na Câmara dos Deputados.

O projeto, que está tramitando no Rio de Janeiro, propõe a obrigatoriedade da redução das mensalidades em, no mínimo, trinta por cento (30%) e já foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), portanto, segue em discussão. Diferente do que sugere o estado fluminense (descontos nas mensalidades desde o ensino superior até o ensino fundamental), Clarissa Garotinho (PROS-RJ) estende a obrigatoriedade do desconto para todo o país apenas para o ensino fundamental e médio. O valor segue os mesmos parâmetros dos trintas por cento (30%) proposto na ALERJ. 

Vale lembrar que ambos os projetos de leis justificam este desconto até o fim da suspensão das aulas presenciais por conta do coronavírus. Os políticos alegam, em suas justificativas, que as instituições estão economizando com o consumo de água, luz, material de limpeza, alimentação de funcionários e entre outros custos.

  • O que disseram os citados?

A VAVEL Brasil procurou o Ícone Colégio e Curso levando os relatos dos responsáveis financeiros apresentados à nossa equipe e perguntamos quais medidas poderiam ser tomadas. Em nota, o diretor Fernando Venancio anunciou que, caso estejam vencidas, não serão cobradas as multas e os juros nas mensalidades de abril.   

“A questão é que os custos operacionais da escola se mantêm os mesmos, exceto a redução dos valores da conta de água e luz. Porém, essa diminuição é irrisória diante dos custos com seus quase 100 colaboradores, bem como as outras despesas fixas de qualquer empresa! Entendemos o momento difícil, mas essa é a realidade! A escola está mantendo, com maestria, o que é atestado pelos alunos e pais, a rotina de estudos e está mantendo seus compromissos em dia com seus colaboradores e credores de modo geral. Comunicamos que não serão cobrados juros e nem multa, em caso de atraso, no pagamento da mensalidade de abril."

A nossa equipe de reportagem também entrou em contato com o Centro Universitário IBMR e Centro Educacional Silva Xavier, mas não tivemos retorno sobre o assunto até a publicação desta matéria.

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