Por muitos anos, o jornalismo como um todo serviu de base de estudo para pesquisadores da área que buscavam entender como se comportam os grandes veículos de comunicação. 

A VAVEL Brasil fez um apanhado das teorias e análises que abrangem todo o campo do jornalismo. Entretanto, faremos uma análise das metodologias aplicadas à editoria esportiva, mesmo que elas se adequem em todos os âmbitos da comunicação.

Teoria do Espelho

Surgindo no início do século XX, a primeira metodologia de estudo começou a ser desenvolvida para explicar o comportamento da imprensa informativa que surgia na época e as notícias que eram veiculadas nos jornais, que davam os seus primeiros passos até atingir a evolução tecnológica que conhecemos na atualidade.

O nome "Teoria do Espelho" se dá porque ela entende que o jornalismo deve ser um espelho da realidade -- em outras palavras, o jornalista deve cumprir a sua função de ser isento de qualquer parcialidade, espelhando o real.

Na época de seu surgimento, a imprensa americana criava o seu próprio estilo que conhecemos e usamos até hoje no Brasil, com lead e Pirâmide Invertida, para evitar a subjetividade dos fatos. 

Entretanto, tal teoria não pode ser aplicada fielmente. A máquina fotográfica mostra claramente que mesmo que o jornalista ou fotógrafo seja imparcial, cada profissional tem uma visão diferente do fato, existem visões de mundo diferentes, com interpretações distintas.

 

(Foto: VI-Images/Getty Images Sport)

 

Exemplo: em um jogo de futebol, um repórter de um determinado veículo precisa sempre estar saindo do comum para evitar a mesmice que cerca uma partida de futebol. Portanto, ele entrevista torcedores dos dois lados para procurar histórias peculiares a fim de fazer a matéria que vai ao ar ou às páginas de jornal. 

Enquanto isso, o outro repórter de uma empresa concorrente também está nesse mesmo jogo, só que relatando fatos diferentes, porque ambos têm visões de mundo distintas e seguem o que mais lhe chamam atenção para abordar o mesmo evento.

Gatekeeper

A teoria de origem americana surgiu em 1950, com o teórico David Manning White, que buscava entender como as redações filtravam as notícias. Quando observou as empresas de notícias, White percebeu que muitas eram rejeitadas pela falta de espaço, e o editor era quem filtrava o que entrava ou não nas páginas de jornal.

O nome Gatekeeper não possui uma tradução literal, mas, de forma livre, é como se fosse um porteiro que seleciona as notícias mais importantes de acordo com a linha editorial da empresa.

Na atualidade, essa prática é muito comum em blogs, pois o blogger fala sobre determinados assuntos à sua escolha, seguindo o seu estilo. Sites e portais seguem o mesmo pensamento. Na VAVEL Brasil, por exemplo, existem diversos editores que passam para os redatores as pautas que seguem a linha editorial do próprio portal, seja ela sobre futebol ou ciclismo, todas passam pelo editor que designa o espaço que a matéria vai ter no veículo.

Embora White tenha analisado os editores, muitos estudiosos à época passaram a criticar a sua teoria, alegando que existem outros elementos a serem analisados além da escolha pessoal ou da linha editorial de um determinado veículo.

Newsmaking

A teoria do Newsmaking se baseia por uma pergunta: “O que é notícia para os jornalistas?”. Tal conceito busca entender o que leva a escolha de algumas notícias tirando a prioridade de outras.

O Newsmaking se divide em “critérios de noticiabilidade” ou “valores-notícia”, que são avaliados pelas seguintes preceitos:

Morte/Negatividade: onde há morte há jornalistas.

Notoriedade: vai de acordo com a hierarquia da figura na sociedade, seja ele um ator, político ou esportista. Todos eles têm uma certa notoriedade que vale ser ressaltada quando participam de algum fato.

Proximidade: estar próximo do fato permite uma melhor apuração, além de culturalmente ter um impacto maior sobre o leitor. Dificilmente são divulgadas notícias sobre o continente africano, por conta da proximidade e muitas vezes pela diferença cultural e econômica da África.

Relevância: quando o fato tem um impacto sobre a população do país. Um exemplo disso é a reforma trabalhista, que fora aprovada recentemente pelo Senado.

Novidade: acontecimentos fora do comum, como um time que nunca disputou o Mundial de Clubes ser campeão em sua primeira participação, ou a descoberta de um novo planeta no Sistema Solar, por exemplo.

Adotando os raciocínios acima, é possível avaliar onde os veículos de grande circulação se baseiam para dar prioridade em alguns casos que geram interesse público.

De acordo com o pesquisador que desenvolveu o preceito, Mitchell Stephens, os valores-notícia não mudaram com o passar dos anos; as mesmas notícias que podem ser vistas em jornais de décadas atrás, priorizando morte, acontecimentos fora do comum, ocorrem até hoje.

Tal teoria explica o pouco espaço para diversos acontecimentos que ocorrem no dia a dia da população e passam despercebidos pelo profissional da área da comunicação. Ou, simplesmente, são tantas notícias que chegam ao jornalista que esses filtros de notícia são utilizados para priorizar certos fatos.

Agenda Setting

A agenda setting é a teoria que avalia o impacto que as notícias têm sobre a população após o seu consumo, ou seja, depois que divulgadas ao público. Nesta teoria, a ideia principal está no seguinte conceito: a mídia “agenda” os temas que devem ser pautados na vida das pessoas.

Mauro Wolf, pesquisador brasileiro na área, diz em seu livro Teorias da Comunicação “que o conceito que a população tem da realidade social é algo que lhe é emprestado, pois é esquecido rapidamente, isso é um efeito da mídia de massa”.

 

(Foto: Steffi Lobos/Getty Images)

 

É possível perceber isso em épocas do ano, como o verão, onde diversos casos de dengue passam a ser noticiados com frequência, mesmo que eles aconteçam o ano inteiro. A mídia impõe o pensamento na vida das pessoas para que se preocupem sobre as precauções que devem ser tomadas. Quando a época de “preocupações” passa, a população imediatamente esquece o que foi “agendado” pela grande mídia.

Racismo no esporte é outro caso específico. A mídia de forma geral começa a dar mais ênfase para outros casos, com o intuito de prevenir e conscientizar a população.

Enquadramento

O Enquadramento, ao contrário das outras, não é uma teoria, mas sim uma análise. Também pode ser encarado como um segundo nível da agenda setting, visto que é algo mais aprofundado.

A agenda setting expõe às pessoas o que pensar sobre determinados fatos e períodos da história. Já o Enquadramento busca estudar em como a mídia abordou períodos e acontecimentos.

Tal análise “enquadra” as notícias em critérios que buscam entender a visão sócio-política de uma organização. Além disso, é um preceito muito utilizado em períodos políticos para avaliar a parcialidade de um site, revista ou programa televisivo.

Na análise, os seguintes critérios podem ser observados para que uma conclusão final sobre a parcialidade seja encontrada:

Fontes de informação, a quantidade de entrevistados na defesa de um e na acusação de outro, por exemplo;

Manchetes que são interpretadas de formas distintas em um mesmo fato;

Imagens que, em ângulos diferentes, dão uma conotação diferente à situação;

Adjetivações como: ladrão, corrupto ou vagabundo e desleal. São formas de ver como um veículo enxerga um personagem, seja ele político ou celebridade;

Relação entre fotos e legendas, além da quantidade de imagens também são uma forma de induzir o leitor a compreender melhor o fato, visto que alguns veículos utilizam de poucas imagens com legendas que dizem pouca coisa e outras que traduzem de forma parcial a visão de um suposto personagem.

No caso do esporte, é possível perceber um favorecimento se formos avaliar casos de regionalismo nas transmissões ou na cobertura de um time em específico. Quando um clube grande é campeão de um campeonato regional, a quantidade de imagens é muito maior do que quando um tradicional do interior do estado vence ou até mesmo pelas pautas que são trabalhadas somente sobre times de maior expressão, sejam eles no Brasil ou na Europa, a premissa de prioridade é a mesma.

Importância das teorias para o meio jornalístico

Em busca de saber mais sobre o assunto, a VAVEL Brasil entrevistou o professor universitário e pesquisador da área de teorias jornalística Flávio Agnelli Mesquita. Ele contou sobre a importância de conhecer tais teorias mesmo com as transformações constantes do jornalismo.

“Falando sobre as Teorias do Jornalismo, elas são tão importantes quanto a 100 anos. O que seria preciso, a meu ver, é uma adequação dessas visões ao universo web, que alterou significativamente os processos de comunicação jornalísticos. A Teoria do Agenda Setting é um grande exemplo disso. Está claro que a web e as redes sociais digitais estão agendando fortemente a população, ou seja, o agendamento que antes se restringia às mídias tradicionais vê agora outras ferramentas importantes”, disse.

Flávio acredita que ter embasamento teórico é essencial para exercer a função jornalística, além de conhecer como se comportam os grandes veículos se formos analisar pelos preceitos das teorias jornalísticas.

“Estudar as teorias é tão importante quanto sempre foi. O embasamento teórico nos leva a compreender os conceitos da comunicação, a forma como o jornalismo é produzido e o impacto nas pessoas. Esse processo vale para mídias tradicionais – impresso, rádio, TV –, mas também para qualquer mídia que vier a surgir”, lembrou.

Com o crescimento constante e a incessante busca por informações, o jornalismo atual mesmo que esteja evoluindo a cada dia possui as suas deficiências necessitando se adaptar e explorar melhor algumas ferramentas como a própria. Com base nas carências do jornalismo, Flávio apontou o que falta na profissão dos dias atuais.

“Na minha visão, estamos carentes dos princípios jornalísticos. Veja que interessante: falamos muito sobre inovações, tecnologias de comunicação etc, mas esquecemos de discutir sobre: ética, apuração dos fatos, checagem das fontes, boa redação textual. Isso é básico, existe desde que o jornalismo é jornalismo. Entretanto, são valores deixados de lado em muitos dos profissionais atuais”, finalizou.